Nascido em Araguary, no
Triângulo Mineiro, em 1926, Farnese de Andrade Neto entrou em 1945 na Escola do
Parque de Belo Horizonte, onde foi aluno de Guignard e contemporâneo de
artistas como Amilcar de Castro, Mary Vieira e Mário Siléso. Começou a carreira
como desenhista e gravador e, a partir de 1964, passou a transformar os restos
de madeira e brinquedos que coletava junto com conchas e detritos vindos do mar
em obras de arte. Essas obras — assemblages de composições e formatos variados
.As primeiras caixas de Farnese já misturam bonecos destruídos, mariscos, cacos
e bolas de vidro. Embora tenha sido muitas vezes chamado de escultor, o artista
nada esculpia; apenas dava tratamento ao mobiliário mineiro de roça que
adquiria em fontes diversas (antiquários, feiras e depósito de demolição),
misturando-os à "coleção de restos" que reunia nas praias e até mesmo
na rua. As imagens de santos também são um elemento recorrente em sua obra.
Elas aparecem invertidas, mutiladas ou envoltas em redomas (nas peças mais
antigas) ou resina (mais recentes).Na composição de Farnese,chamada de
"Anunciação" (1984), uma gamela de madeira em cujo fundo o artista
acrescentou uma foto de bebê e a forma de um ovo.
Para a crítica Uiara Bartira a obra de Farnese
está estruturada a partir de signos. Apesar de profundamente autobiográficas,
suas peças abordariam o tempo inteiro a dualidade entre a vida e a morte — e a
angústia do homem diante do fato inevitável de que vai morrer. Outros
antagonismos, como o entre feminino e masculino, também são abordados nas
"assemblages".
"Suportes como gamelas, oratórios,
armários e caixas de resina são utilizados como ‘corpo’ e definem diferentes
segmentos. As gamelas falam da sensualidade — o feminino —, o que está embaixo.
Os oratórios, da cerebralidade — o masculino —, o que está em cima. Os armários
discutem sexualidade, o egoísmo, a posse. As caixas — inside — o egocentrismo.
Nas resinas residem os medos, as inseguranças e as ansiedades", escreve
Uiara.
Bonecos queimados ou mutilados também são
outra marca da obra do artista, como se observava na série de trabalhos sobre a
tragédia atômica de Hiroshima, que estava presente na mostra do CCBB. Eles
também aparecem no filme "Farnese" (1970), dirigido e roteirizado
pelo crítico de arte Olívio Tavares de Araújo e escolhido melhor curta-metragem
no Festival de Cinema de Brasília de 1971. No filme — restaurado em 2001 e
transformado em um DVD que faz parte do livro de luxo "Farnese de
Andrade", editado pela Cosac Naify — a voz em off do diretor comenta o que
o espectador está vendo:
"
Campos de concentração, cidades
devastadas, bombardeiros repletos de Napalm, um humanismo esmagado, a manhã
seguinte em Hiroshima e Nagazaki. É nesta atmosfera que respiram os habitantes
das caixas de Farnese. A eles se aplica um antigo paradoxo. Imagens que não
suportaríamos em sua existência original, depois de reelaboradas pelo artista
adquirem uma nova e positiva dimensão. E oferecem uma emoção vizinha da
alegria: o prazer que resulta, por força, da beleza". No texto de apresentação do catálogo-livro, é do
curador Charles Cosac, também um amigo do artista, estabelece um paralelo entre
a obra de Farnese e artistas do construtivismo brasileiro, como Lygia Clark,
Mary Vieira e Amílcar de Castro. No livro Farnese de Andrade, da Cosac Naify, o
crítico Rodrigo Naves destaca, no texto "A grande tristeza", a
sensação perturbadora que é estar diante das obras de Farnese de Andrade :
"
Conheço pouca coisa mais triste que os trabalhos de Farnese de Andrade.
Essas cabeças de boneca arrancadas do corpo lembram maldades de infância. As
madeiras gastas de seus trabalhos guardam um tempo esponjoso, que se acumula
sobre s ombros e nos paralisa os movimentos. As fotografias e imagens presas
nos blocos de poliéster falam de um passado que nos inquieta, mas que não
podemos remover ou processar, já que não mais nos pertence."
Ahh essas assemblages desse Farnese são muito estranhas, dá até medo,deve ser pq ele crítica as maldades feitas com criancinhas... Aiii
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